Musculação e autoconhecimento

Há 7 anos frequento assiduamente as salas musculação. Hoje sinto que foram 7 anos de prática que substituíram possíveis 10 anos de terapia e um punhado de medicamentos.

Nesse intervalo de tempo, quanto autoconhecimento, quanta percepção sobre mim mesma, quanta observação sobre como minhas condutas com relação as séries de exercício se estendiam à minha realidade profissional e, principalmente quantos aprendizados sobre meus medos, limites e minhas crenças.

E é sobre medos, limites e crenças que vou tratar aqui.

Procurei a musculação quando minha primeira filha tinha 1 ano e 2 meses, com o objetivo de recuperar a forma física que outrora exibia e também a autoestima, que a esta altura estava bastante prejudicada por conta da queda hormonal natural do pós-parto, da mudança de rotina e, principalmente, da mudança física.

Definitivamente, depois que você tem um filho, nada é igual. E a musculação surgiu como uma luz no fim do túnel, uma esperança. E eu sabia que havia algo de bom para mim ali.

Optei por contratar um serviço de personal trainer, pois eu tinha pressa e queria muita eficiência e segurança nos meus treinos. E tudo começou muito bem.

No terceiro mês aliei uma dieta funcional e isso me deu maior velocidade para conquistar meu objetivo de, além de voltar ao meu peso de antes da gravidez, como também ganhar tônus muscular. Eu seguia a dieta à risca, me esforçava para dar o melhor de mim nos treinos.

E aos poucos fui percebendo que esse “melhor de mim” que eu supunha, não era exatamente o melhor de mim. E aí as percepções se aguçaram…

Percebi que eu sempre “roubava” a última repetição. Na maior parte das vezes não a executava ou quando a executava era mais rápido ou sem postura.

E comecei a relacionar com coisas que eu fazia na minha vida, fora da academia… Muitas vezes, estudei, estudei, trabalhei, trabalhei e não concluí o curso ou o projeto. “Morri na praia”, literalmente. Como estava fazendo naquele momento com o exercício.

Outras tantas vezes quando julguei que não tinha mais forças para concluir a série, vinha a voz forte e imperativa do meu treinador dizendo: “Vai Liz, que você tem mais força que isso” ou “Mais uma que eu sei que você consegue”.

E quando olhava a parede lá longe e mensurava o percurso que faltava para chegar lá com as passadas… Medo. Medo. Medo.

E uma voz interna que dizia: “Não vai dar. Muito longe”. Essa é uma das cenas que tenho gravada de mim que ainda hoje me enche de emoção. Mais um aprendizado!

As vezes as pessoas enxergam em você uma força que nem mesmo você sabe que tem. Mas está lá e transparece. Você é que tem medo de acessar.

Aprendi sobre persistência. No início eu tinha pressa… muita pressa. Para desfilar um corpo esbelto, barriga seca e “bumbum na nuca”. E com a prática aprendi que esse corpo “perfeito” exige persistência. Assim como meus sonhos.

No início é desafiador, os resultados não aparecem da noite para o dia e para alcançá-los é necessário clareza sobre onde quer chegar e persistência para não desistir no meio do caminho.

Aprendi sobre disciplina. Para você conseguir organizar horários de treino, refeições nos horários certos e manter sua rotina de casa-trabalho-filho-marido, muita disciplina é necessária. O preço é alto.

Na vida também é assim. Viver o sonho, se desafiar no talento, exige disciplina, organização, empenho, dedicação. Seu talento é nato, por óbvio. Mas desafiar-se nele e se tornar excelente, exige muita disciplina.

Aprendi sobre relacionamentos de apoio. Para você evoluir na musculação e na construção do seu “corpo ideal”, você precisa contar com bons parceiros de trabalho: academia de qualidade, treinador, nutricionista e, principalmente, que o seu cônjuge te apoie.

Na vida real também é assim… Para que você enquanto mulher possa trabalhar, evoluir no seu sonho, desenvolver o seu talento, precisa de relacionamentos de apoio de alta qualidade: colaboradora para te ajudar com as coisas da casa, a cuidadora-babá-professora de alta confiança para deixar seus filhos com tranquilidade, avós que te socorram no caso de alguma viagem e, disparado, um marido que te apoie. E eu tive. Sempre tive!!

Aprendi sobre crenças. Se você dá ouvidos àquela voz que diz que “não vai dar, que está muito longe” e acredita nela, você desiste no meio do trajeto. Às vezes me sinto como uma criança pequena olhando todos aqueles aparelhos e pesos.

Vejo atletas, maratonistas, nadadores, ginastas e penso que o desafio é grande demais pra mim. E na série de flexão quando o treinador pede “Desce mais”, novamente o Medo.

Medo de não conseguir subir, do braço travar, de cair com a cara no chão. Na vida real também acontece. Quantas vezes você até é capaz, mas o medo de a voz travar, de “dar um branco”, e de quebrar a cara te fazem desistir antes mesmo de tentar.

Aprendi que medos, limites e crenças estão aí para serem dissolvidos, superados, curados, sanados.

Descobri que chegar ao final da série com repetições perfeitas me proporciona satisfação, congratulação, contentamento e a certeza de que estou subindo mais um degrau rumo ao meu objetivo. No final do treino, alívio e felicidade plena.

E se existia relação tão próxima das questões e desafios da musculação com coisas da vida, certamente a superação disso também. E aos poucos fui me permitindo observar dentro de mim e descobrir do que eu tinha medo, ao que estava relacionada essa limitação, essa crença de que eu não conseguiria.

E olhar pra dentro sempre é algo muito desafiador. Afinal, somos ensinados, desde muito pequenos a olhar pra fora e projetar no mundo externo nossas frustrações, insatisfações, medos e limitações.

Desenvolvemos uma enorme habilidade de se justificar para evitar entrar em contato com o mais profundo que há em nós. Foi um processo doloroso. Senti-me frágil, sensível, carente, vazia. Chorei muito. Já não projetava mais a imagem de força de antes.

Meus amigos começaram a manifestar preocupação com meu semblante. Mas cada segundo, cada pensamento, cada meditação, cada leitura, cada conversa valeu a pena e me apoiou a perceber que meu medo era de romper a zona de conforto e não conseguir mais estabelecer a ordem nas coisas.

Assim como na academia meu medo era sucumbir a dor, ao travamento do músculo, meu medo na vida real é de sucumbir ao caos. Mas o caos faz parte do movimento de dar um passo além do que você domina. Identificado meu medo e a crença de “não dar conta”, pude dialogar com ambos e caminhar em direção ao que fazia sentido a minha essência.

Na academia eu tinha medo daquele descontrole muscular quando estava chegando perto da exaustão. Na vida real eu tinha medo de não conseguir mais ter controle sobre as coisas que acontecem… E falando francamente, quem disse que controle te leva a algum lugar?

O que me encanta no autoconhecimento é a sensibilidade com que você observa situações simbólicas e como elas representam também a forma como encaramos a vida.

Aprendi que não é necessário controle. Mais necessário que isso é estar aberto para cumprir a sua missão e descobrir a forma mais harmônica e alinhada internamente para você vivê-la. Sou imensamente grata a musculação e ao meu treinador por todo o aprendizado, força, beleza e, principalmente, persistência que isso trouxe para a minha vida.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

TOP